quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Gripe A, reposição das aulas e a legislação educacional



Sadi Nunes

Uma discussão paralela ao grave problema da Gripe A estabelecida entre os educadores tem sido a questão da forma de reposição das aulas e da possível prorrogação do ano letivo para cumprimento integral do calendário escolar. É evidente que os Sistemas de Educação, em conjunto com o Ministério Público, quer seja Federal ou Estadual, que está empenhado nas recomendações para a prevenção da Influenza A, encontrarão alternativas que garantam o direito dos alunos ao período letivo mínimo.

O objetivo deste pequeno trabalho é discutir a questão confirme a legislação educacional, já que caberá exclusivamente às autoridades educacionais a identificação da melhor forma de reposição das aulas. Isso porque não existe amparo jurídico específico para a dispensa da reposição. No entanto a própria Confederação Nacional dos Trabalhadores na Educação (CNTE) já manteve contato com o Ministro da Educação, visando uma discutir uma flexibilização do período letivo, o mesmo ocorrendo com a APP/Sindicato no Paraná.

Mas no que consistiria esta flexibilização do ano letivo? A própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional é por natureza flexível. Dispõe, no entanto, no Art. 24, Inciso I, que “ a carga horária mínima anual será de oitocentas horas, distribuídas por um mínimo de duzentos dias de efetivo trabalho escolar, excluído o tempo reservado aos exames finais, quando houve”. O § 2º do art. 23, por sua vez, possibilita esta flexibilização, sem admitir, no entanto, a redução do período letivo mínimo: “o calendário escolar deverá adequar-se às peculiaridades locais, inclusive climáticas e econômicas, a critério do respectivo sistema de ensino, sem com isso reduzir o número de horas letivas previsto nesta Lei”.

Desta forma, o cumprimento da legislação educacional quanto a esta questão não pode ser dispensado, considerando o direito subjetivo do aluno aos 200 dias letivos. Mas em se tratando de situação excepcional, como na pandemia da Gripe A, onde a suspensão das aulas ocorreu por decisão estatal e por recomendação das autoridades sanitárias, ainda é possível a dispensada da reposição?

Não existe amparo específico para esta questão no sistema jurídico. Mas há na legislação educacional normas que poderiam ser utilizadas por analogia para uma esta flexibilização do calendário desde que comprometa o direito do aluno. A base destas normas é o Decreto Lei nº 1.044/69, que “Dispõe e tratamento excepcional para os alunos portadores de doenças infecto-contagiosas”. No seu art. 2º, a lei prevê compensação da ausência às aulas “através de exercício domiciliares com acompanhamento da escola, sempre que compatíveis com o seu estado de saúde e as possibilidades do estabelecimento”. No art. 1º, letra c, a lei dispõe ainda que a compensação não deve ultrapassar “o máximo ainda admissível, em cada caso, para a continuidade do processo pedagógico de aprendizado”, ou seja, a duração do impedimento da frequência não poderá compromete de forma expressiva o ano letivo.

A Lei 6.202/75, também “atribui à estudante em estado de gestação o regime de exercícios domiciliares instituído pelo Decreto-lei nº 1.044, de 1969”. A partir do oitavo mês de gestação e durante três meses a estudante em estado de gravidez ficará assistida pelo regime de exercícios domiciliares. Outras normas como Lei nº 715/69 (Serviço militar) e Decreto nº 85.587/80 (Militar da reserva convocado para serviço ativo) seguem na mesma lógica.

A Leis 8.672/93 (Lei Zico), no art. 53 e Lei 9.615/98, art. 85, também conferem aos sistemas de ensino da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como as instituições de ensino superior, a possibilidade de definição de “normas específicas para a verificação do rendimento e o controle de freqüência dos estudantes que integrarem representação desportiva nacional, de forma a harmonizar a atividade desportiva com os interesses relacionados ao aproveitamento e à promoção escolar”. Ora, se é permitido à estudante gestante ou a um atleta tal flexibilização, não poderia ser aplicada neste caso extremo, cuja suspensão atendeu ao interesse público?

Desta forma, levando-se em considerando a suspensão das aulas em caráter oficial devido à natureza pandêmica e infecto-contagiosa da Gripe A e quantidade de dias letivos não cumpridos que não comprometa a aprendizagem, dentro de um nível de razoável, seria possível a compensação da ausência às aulas nesse período com atividades domiciliares e afins, sem a necessidade de prorrogação do calendário escolar. Algumas escolas particulares, por exemplo, deram continuidade ao calendário com exercícios domiciliares via Internet. Ressalte-se que aluno pode faltar até 25% do período letivo, ou seja, no máximo 50 dos 200 dias previstos na LDB. No entanto, a maneira de como se dará a reposição ficará a cargo dos sistemas de ensino, respeitados os direitos dos alunos e dos trabalhadores na educação.
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Sadi Nunes é professor e advogado em Toledo

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